Ensaio fotográfico à volta de um dia de pastoreio pelas Terras Altas da Serra da Estrela.
"Alta, imensa, enigmática, a sua presença física é logo uma obsessão. Mas junta-se à perturbante realidade uma certeza ainda mais viva: a de todas as verdades locais emanarem dela. Há rios na Beira? Descem da Estrela. Há queijo na Beira ? Faz-se na Estrela. Há roupa na Beira? Tece-se na Estrela. Há vento na Beira? Sopra-o a Estrela. Há energia eléctrica na Beira? Gera-se na Estrela."
— Miguel Torga
Foi um ano duro para a Serra da Estrela. O Verão não deu tréguas com os incêndios e boa parte do território florestal da Serra da Estrela foi devastado pelas chamas. Como dizia a Lusa ao mundo, “O Parque Natural da Serra da Estrela foi atingido por incêndios que afectaram 25% da sua área total e causaram efeitos negativos muito significativos em locais de sensibilidade ecológica elevada.
Mas não é de más notícias de que vos quero falar. O passado deixou marcas fortes. Hoje, quero contar-vos as boas. Uma história de vida, viva,
Agora, em Dezembro, nos antípodas desse verão quente, lidamos com o vento do norte e as chuvas dos céus, damos olho a 50 ovelhas da serra da estrela, enquanto vos conto uma história de gente bonita que me inspira.
A chuva caiu sim. É muito bem-vinda, mesmo caindo à bruta, como tem sido.
Ali para os lados de Folgosinho, no concelho de Gouveia. Contorna pela esquerda a muralha do relógio, como quem vai para o Casal das Pias que, para não pensarem que é destino de tinto e pipas, a Ana e o André deram o nome de Vale Velho. O nome da quinta encaixa como uma luva para uma bióloga (Ana) e um arqueólogo (André) que em 2020 largaram as terras saloias do Oeste para uma aventura num dos Parques Naturais mais incríveis do nosso país, a Serra da Estrela.
Ana = Bióloga = União da Ecologia = Vale
André = Arqueólogo = Saberes Ancestrais = Velho
(liberdade criativa do autor)
São 100 hectares de terrenos antigos que abrigam necrópoles da época alto-medieval, cursos de água naturais, e todo um potencial de recursos que merecem uma transição natural até à paisagem equilibrada que existia no passado, quer antes da influência humana, com as florestas pristinas e pastagens naturais, como posteriormente com as culturas, como soutos, campos de centeio e lameiros.
Como diziam os antigos, carregados de pragmatismo, A natureza vence sempre! O grande desafio é que seja connosco por cá.
As premissas são simples e de poucas palavras. Restauro ecológico, reflorestação, desenvolvimento e valorização dos saberes ancestrais, com pitadas valentes da vida calma do campo. Sem pressas, com a colaboração da comunidade, a parceria das associações do meio e a amizade de quem se quiser juntar.
Bem perto dos 1000 metros de altitude, estas ovelhas bordaleiras autóctone deambulam tranquilamente pelo campo de aveia, ainda verde, carregado de nutrientes. A Roberta, uma das ovelhas que pariu recentemente, está a ver se escapa. Tem saudades da cria, diz a Ana. Ovelha-galinha, digo eu. A ver se crescem saudáveis para darem bom leite para produzir um bom queijo da Serra.
Há tanto tanto para fazer...
Recuperar todo o território ambiental e criar pontes com a agricultura biológica em sintonia com os ritmos da natureza. Sem pressas, sem químicos, sem tratores e cultivo intensivo. A ideia base trazer de volta a paisagem natural das pastagens e florestas e, para variar a norma, estar em sintonia com toda a montanha imensa que nos envolve.
No entanto, deixam um vontade.
Vale Velho para hoje, Reserva Etnoecológica do Vale Velho para amanhã.
Hoje foi mais uma gota de água da grande chuvada que é o Vale Velho.
Pois, não é que o sol apareceu!
Esta viagem, em imagens, conta um dia tranquilo de chuva invernal pelas terras férteis da montanha, na feliz companhia da Ana Teresa Matos. Obrigado, Ana!
Podem seguir aqui o projecto Reserva do Vale Velho • Serra da Estrela
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Registo e viagem em parceria com
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